sexta-feira, 10 de abril de 2009

Renascer das cinzas

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CINZAS DO DESPEJO

Foi assim de repente
mamãe descobriu o pulguedo
seguindo indiscretas pistas
até o Quartinho de Despejo:
pulgas se multiplicavam

caçavam por toda a casa
quintal e até vizinhança
cães, gatos, pássaros e gente
sangue quente
praga de pulgas !

De onde vieram tantas ?

Foi a Queixuda ! Feiticeira !
Mamãe desconfiava muito:
a vizinha de baixo

Queixo proeminente
baixa estatura
semblante aflito ainda que calma
Olhar sôfrego incerto
de bruxa

Eu tinha quase catorze anos.
Papai tentou salvar alguma coisa
e havia muita coisa no Despejo
livros, álbuns de família
lembranças do Espírito Santo

A única fotografia da Vovó Hortência
com o Vovô Benedito
felizes mesmo sem saúde
distantes e sem medo
da morte e das pulgas

Papai foi duramente atacado.
Atearam fogo ao Despejo.
Muita gente foi ver.
A fumaça cobriu o céu.
Tudo queimou

Não me lembro da Vovó Hortência
perdi a lembrança no incêndio
perdi também meus primeiros poemas
queimaram ainda em estado bruto
inéditos no meu caderno de sétima série

Foi a primeira grande perda da minha vida
Aí, para continuar
para sobreviver
Tive que renascer
das cinzas do Despejo

2 comentários:

  1. Renascer das cinzas todo dia, como a Fenix, nem sempre é facil, confesso que as vezes me sinto perdido, nos anos que passaram, nas pessoas que passaram, nos lugares que passei. Mas como uma bússula a poesia me norteia e consigo viver cada dia, dos mais nublados aos bem claros sempre com olhos bem vivos de quem espia pela primeira vez.

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  2. estou ainda bem no início da viagem, comecei o curso em fevereiro. Meu objetivo e chegar até o fim mas ja deu pra ver nestes poucos meses que é uma meta ousada que pretendo alcançar. Obrigado pelo comentário, vou visitar seu blog sempre que puder.

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